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Poema-Ponte: três poemas de Adolfo Caboclo

Foto do escritor: Dee MercêsDee Mercês

Atualizado: 12 de jan.

Artista, curador e poeta, Adolfo Caboclo traz a irreverência e a profundidade de seus versos inéditos para a coluna luso-brasileira da Geração de 20. Confira!


Poema-Ponte: três poemas de Adolfo Caboclo
Foto: Pedro Rosa

A coluna Poema-Ponte, espaço de encontro e travessia entre as poesias de Brasil e Portugal, apresenta nesta edição a obra de Adolfo Caboclo. Nascido em São Paulo em 1986, Caboclo é artista, curador e poeta. Atualmente, está cursando o doutorado no Colégio das Artes da Universidade de Coimbra e atua como pintor residente no Ateliê Fábrica. Sua trajetória inclui a curadoria de diversos projetos expositivos, a criação do Sarau das Flores e da Revista Baleia, bem como a participação no coletivo Pescada nº 5.


Poema-Ponte: três poemas de Adolfo Caboclo:


Sete lares


Decidi ser pirata,

navego com a maré

– nu ou com a gravata –

e bebo rum de café.


Crânio no estandarte,

me expresso sem pudor.

Não falo mais de arte

e nem quero ser doutor.


Acabaram meus versos,

rasguei todo caderno,

não me sinto perverso

e um tanto fraterno.


Uso bota de couro,

namoro na areia,

vou atrás de tesouro

e fujo da sereia.


No cinza ou na mata,

só quero o profundo.

Decidi ser pirata,

o mais livre do mundo!


Ladeira


Ela sobe toda a ladeira,

com o caos, bem ali nas costas.

E se sente bem pouco certeira,

divaga pensando em apostas.


Mas morre, de alguma maneira,

enquanto não sabe o que gosta.

Descansa, lá naquela cadeira,

daquele banquete: indisposta.


Esbarra no mito que foi dito,

nisso entende que errou a mão.

Feriu com navalha em conflito.


Perdeu-se banhada na ilusão

luziu vela torta, lá no rito

Enquanto subia, escorregão.


Poema do coração cansado


E se eu não aguentar a distância?

E bater o pé no chão,

como era na infância.

Ou me amargurar como um velhote,

incomodado com mosquito, na fila do pão.


Ser um camisola nove sem rebote;

Um pugilista nas cordas, crucificado;

Um motorista na noite, embriagado;

Um carpinteiro sem martelo e serrote.


E se eu morrer mesmo de amor?

Minha família vai chorar

e se quer teria doutor

pra tentar me ressuscitar.

Os meus quadros vão guardar

e eu nunca mais vou te encontrar.


E se o meu coração exausto parar?


Iria ser uma história de cinema,

em que você não conhecerá Ipanema.

Até mesmo o bom Pai parará de dançar.

Vai colocar a mão no bolso.

A revista Baleia teria a edição "Caboclo".


Com o coração desligado,

meu corpo sem vida e malandragem,

cairá aos pés de Nossa Senhora da Boa Viagem.

Meu primo ficará com minha guitarra.

O Manoel com o cavalete;

Dona Célia com o cacto;

Jaqueline com a biblioteca.


Se o meu peito parar de bater,

mesmo que seja por alguns minutos,

nunca teremos nossos miúdos!

E apesar de voar para alguma constelação,

eu só queria morar no infinito desse seu coração.


(Todos os poemas são inéditos)


 

A Poema-Ponte é uma coluna quinzenal dedicada à poesia luso-brasileira, com curadoria do poeta português Pedro Albuquerque e edição do poeta brasileiro Dee Mercês. A cada edição, a coluna apresenta poetas emergentes ou com trajetórias mais consolidadas de ambos os países, fortalecendo o intercâmbio literário.



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