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  • Foto do escritorDee Mercês

Poema-Ponte: três poemas de Kátia Nascimento

Atualizado: 12 de jun.

Poema-Ponte: três poemas de Kátia Nascimento (Geração de 20)
Foto: Hugo Ribeiro

Kátia Nascimento, do Rio Grande do Sul, encontra-se temporariamente em Portugal a tirar o doutoramento. Tem publicados: A Vida Mística de Eugênia (2017), Rio das Pedras (2021), Fio do Silêncio (2022), em parceria com André Soltau, Emboscada (2023) e Crônicas de Saravá – memórias de um cavalo de Umbanda (2023).


***


Poema-Ponte: três poemas de Kátia Nascimento



Emboscada


A vida, de tocaia, espreita na porta de casa.

O universo conspira para que finalmente alguém pague a conta.

A dívida parece não ser tua.

Mas alguém tem que pagar pelo trato, pelo distrato, pelo contrato.


A cilada foi armada.

Acaso alguém quer saber?


A vida, de tocaia, espreita na porta de casa.

E tu voltas como quem quer esfregar a conta na cara.

Dívida de muitos, de todos.


Grande dívida.

Quem não participa do enredo, azar.

Entrará na partilha do bem.

Da conta.


A vida, de tocaia, espreita na porta de casa.

E não adianta revidar, ela bate miudinho, com a ponta dos dedos.

Atende aí!


O que fazer justamente agora, quando te sentias tu,

Seguro, encaramujado, sem ninguém a importunar?


Mas a vida, de tocaia, espreita na porta da tua casa.


in Emboscada, 2023, pág. 17



Deixo meu homem ir


Vejo meu homem ir.

O céu virar chão.

O coração se fechar, insistente,

Para sempre, talvez.


Vejo meu homem ir.

Tento segurá-lo, por instantes.

Num esforço inócuo arrastá-lo,

Novamente, para mim.

Inocente eu.


Vejo meu homem ir.

Decisão implacável.

O amor é sofrido, cansado, atormentado.

Descrê. Com razão.


Vejo meu homem ir.

Percebo, em prantos,

Que esforço tamanho é inútil.

O sofrimento aumentará,

Caso não consiga aceitar,

Meu é pronome.

O que devo deixar partir não é o homem,

É a paixão, a ilusão, a contravenção, a transgressão, o dolo.

Deixo o meu homem ir...


in Emboscada, 2023, pág. 29



Voo


saída chegada permanência

percorro o oceano

arremessada me vou longe


saída

deixo o que me é mais caro

vou ao encontro de algo

ao encontro do nada

chegada


me deixo invadir pelo destino

me derramo no desconhecido

me esparramo, abandonada


permanência

em saindo deixo

em chegando ouso

em permanecendo

me permito.


(Poema inédito)



***


Poema-Ponte é uma coluna quinzenal de poesia Luso-Brasileira, com curadoria a cargo do poeta português Pedro Albuquerque e edição do poeta brasileiro Dee Mercês. Nesta coluna, são apresentados poetas emergentes ou com trajetórias mais consolidadas de ambos os países.


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