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Foto do escritorDee Mercês

Do Conto ao Romance: a trajetória literária de Marília Arnaud

Atualizado: 15 de out.

Do conto ao romance: a trajetória literária de Marília Arnaud

Marília Arnaud, contista e romancista paraibana, nascida em Campina Grande e radicada em João Pessoa, possui uma vasta produção literária. É autora de quatro livros de contos, com destaque para A menina de Cipango (Prêmio José Vieira de Melo) e Os campos noturnos do coração (Prêmio Novos Autores Paraibanos), além de O livro dos afetos e o infantil Salomão, o elefante. Sua obra também abrange os romances Suíte de silênciosLiturgia do fim e O pássaro secreto, vencedor do Prêmio Kindle de Literatura em 2021. Marília é presença constante em diversas coletâneas de contos, consolidando sua posição no cenário literário brasileiro.


Marília Arnaud, um nome que talvez não ecoe em todos os cantos do país, mas que carrega consigo uma trajetória literária longa e um talento inegável. É intrigante como uma autora com tamanha experiência e habilidade pode passar despercebida por tantos leitores. Desde os anos 80, Marília vem construindo uma obra sólida, com livros que, em alguns casos, são mais antigos e maduros do que este entrevistador que vos escreve.


Sua jornada começou de forma despretensiosa, com contos e crônicas em periódicos regionais, até a publicação de seu primeiro livro, que plantou a semente para uma carreira prolífica, com diversos livros e participações em antologias de contos.


A transição para o romance não foi motivada por questões comerciais, mas sim pelo desafio de explorar novos horizontes literários. Essa versatilidade a consagrou como uma escritora completa, capaz de dominar tanto a narrativa curta quanto a longa.


A conquista do Prêmio Kindle de Literatura em 2021, com seu romance O pássaro secreto, a primeira nordestina a alcançar tal feito, solidifica ainda mais seu talento e a importância de conhecermos sua obra e suas reflexões.


Você, assim como o seu protagonista Inácio, de Liturgia do fim, já disse não saber o motivo para exercer a escrita. Se não é possível entender por que criar literatura, é possível saber, ao menos, o que ela causa?


De fato, não sei afirmar com precisão a razão pela qual escrevo. Penso que qualquer resposta não dá conta de algo tão subjetivo, tão inerente ao próprio existir. Escrevo porque sinto necessidade, porque sou imaginativa, porque sou amante da palavra, porque a criação me causa prazer, não obstante o imenso trabalho com a escrita e as reescritas dos meus textos.


Seus três últimos romances trazem narrativas em primeira pessoa, sobre personagens perturbados. Por que você traz esses retratos tão intimistas de tragédias cotidianas?


Não sei. Não programo nada. Não escolho sobre o que escrever. Escrevo, simplesmente. As histórias me chegam, os personagens me sopram suas vidas, me pedem para ser narrados. Os enredos vão se delineando no decorrer da escrita, de forma que, às vezes, o que imaginei no início de um livro acaba se mostrando inteiramente diferente.


Sua carreira já tem cerca de trinta anos, mas só foi mais conhecida a partir de sua vitória na 5ª Edição do Prêmio Kindle de Literatura. Para você, o que isso diz sobre o cenário literário brasileiro?


Isso diz muito sobre a dificuldade de ser autor ou autora em um país como o Brasil. Uma triste realidade, especialmente quando comparada a países vizinhos como Argentina, Uruguai e Chile, que possuem índices de leitura muito superiores ao nosso. Quando "O pássaro secreto" venceu o Prêmio Kindle, muita gente no meu estado nunca tinha ouvido falar da autora Marilia Arnaud. E, como disse você, são mais de trinta anos de ofício ininterrupto, com a publicação de quatro livros de contos, um infantil e, agora, três romances. Obviamente, faltam políticas públicas de fomento à leitura, criação de mais escolas e bibliotecas, e pagamento de salários dignos aos professores, especialmente os do ensino fundamental, momento de formação de leitores.


Paraibana, você representa muito bem sua terra natal e a cidade onde mora por meio de cenários na ficção. Quais sentimentos você espera transmitir aos leitores por meio desses cenários?


Na verdade, não espero nada. Quando escrevo, não penso em leitores nem no que minha escrita poderá provocar neles. Gosto de retratar as paisagens litorâneas da cidade onde vivo e, também, as sertanejas, que conheço bem (na infância, passava minhas férias escolares no sítio dos meus avós maternos no sertão paraibano). Talvez a exuberância desses lugares acabe por fazer um contraponto com a miséria humana narrada em meus livros.


Na sua opinião, qual postura os escritores nordestinos devem tomar diante da suposta hegemonia artística do eixo Sul-Sudeste?


Já foi pior, antes da internet e das redes sociais. O certo é que toda a política de circulação do livro se dá predominantemente no eixo Rio-São Paulo, onde ocorrem os grandes eventos literários (feiras, festas, bienais), onde se localizam as grandes casas editoriais e por onde circulam editores e escritores e escritoras de renome. Algumas e alguns autores, como Itamar Vieira Junior e Maria Valéria Rezende, conseguiram furar essa bolha ao realizarem uma literatura capaz de unir público e crítica.


Além de escritora, você é formada em Direito e trabalha nessa área. O trabalho inspira a criação de suas histórias?


Não. Absolutamente. O que me inspira são os bons livros e filmes e, naturalmente, o ser humano, em seu desamparo, em sua luta pela sobrevivência.


Antes de ser romancista, você já era contista. Qual é a diferença, para você, entre a escrita desses dois gêneros?


Transito bem entre ambos. Os dois têm suas particularidades. Naturalmente, o romance exige do escritor mais tempo, mais fôlego narrativo, mais profundidade na construção dos personagens. Por outro lado, o conto requer concisão e objetividade, de forma que cada palavra tem um peso imenso, não podendo surgir no texto de forma supérflua.


Por fim, quando lhe perguntam qual é o seu livro favorito, qual o primeiro que lhe vem à mente?


Memórias de Adriano – de Marguerite Yourcenar.



Marília Arnaud, com sua vasta experiência e talento inegável, nos presenteia com uma obra rica e profunda, que transita entre contos e romances, explorando a complexidade da alma humana e a beleza das paisagens nordestinas. Sua trajetória, marcada pela persistência e pela paixão pela escrita, inspira novos autores e nos convida a refletir sobre os desafios e as conquistas do fazer literário no Brasil. Agradecemos a Marília por compartilhar conosco suas reflexões e por nos presentear com sua escrita única e marcante.



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Sobre o entrevistador: Enzo Santana Macedo nasceu em Teresina–PI e passou sua infância entre Bahia e Maranhão. Seus contos foram publicados em revistas digitais renomadas, incluindo Aboio e Ruído Manifesto. Para saber mais sobre suas reflexões literárias e opiniões, ele pode ser encontrado no Instagram: @enzo_santana_macedo.


Edição: Dee Mercês.


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